Nessa semana, comemoramos o Dia dos Professores, profissionais que no Brasil são tão desvalorizados. Como alguém que foi completamente transformada pelos professores que atravessaram minha vida, resolvi neste texto homenagear duas educadores negras que foram imensamente importantes para nossa história, embora não sejam tão conhecidas como outras personalidades brasileiras. É nesse ínterim que uma das faces mais nefastas do racismo se mostra: o apagamento de histórias, como essas que contarei. Como diz um provérbio africano, “O rio que esquece sua nascente, seca e morre”. Eu não quero morrer, e por isso conto as histórias das mulheres que me antecederam; assim, eu vivo.
A primeira delas é Maria Firmina dos Reis, a primeira mulher a publicar um romance no Brasil. Maranhense nascida em 1822, ela publicou Úrsula, um dos livros mais interessantes do romantismo brasileiro, porque foi o primeiro onde personagens escravizados tinham falas e, portanto, voz: é nele em que ela escreveu: “A mente, essa ninguém pode escravizar.”. Entretanto, não é sobre a Maria Firmina dos Reis literata que eu vou falar (hoje, pelo menos); mas sim, da professora.
Em 1847, ela foi aprovada para o concurso público da Cadeira de Instrução Primária e, após se aposentar, foi responsável pela primeira escola mista e gratuíta do Maranhão, o que causou tanta repercussão que foi obrigada a fechar após dois anos e meio de funcionamento, tamanha a transgressão. Ainda no século XIX, em que o mundo feminino era estritamente separado do masculino, Firmina propôs uma perspetiva diferente. Afinal, o princípio da escola mista é que tanto meninos, quanto meninas devem possuir a mesma formação – e isso foi uma revolução. Ela faleceu aos 92 anos, cega e pobre.
Antonieta de Barros, por outro lado, já está mais próxima da nossa realidade. Nasceu no início do século XX em Santa Catarina e, apesar da proibição do ensino superior para mulheres à época, ela abriu, em 1922, o Curso Particular Antonieta de Barros para alfabetizar a população carente. Mais tarde, ela assume o cargo de professora na Escola Normal Catarinense. Sua trajetória também é entrelaçada com a vida política do estado onde viveu: foi a primeira deputada estadual mulher e negra do país, sendo a única de seu estado até o ano de 2012, apesar da distância temporal.
Foi ela quem instituiu, em 1935, o feriado do 15 de Outubro, que já era comemorado em algumas partes do Brasil e se refere à primeira grande lei educacional do Brasil, sancionada por Dom Pedro I, em 1827. Em 1963, essa data se estendeu para todo país com o governo de João “Jango” Goulart. Ela também foi uma das fundadoras da Liga do Magistério Catarinense, que lutava pelo direito dos profissionais da educação do estado. Além disso, trabalhou como jornalista e escreveu textos literários. Faleceu aos 50 anos devido a complicações de diabetes.
Como essas mulheres nos mostram, só a educação é capaz de provocar alguma mudança na nossa realidade. Elas não fruíram de riquezas, nem de fama, mas o que elas produziram permaneceu apesar do tempo e está sendo resgatado, a partir de diversas pesquisas históricas. O dia dos professores é, sobretudo, um dia de luta, que mostra o poder de transformação libertador que esses profissionais detêm sob suas mãos. Maria Firmina dos Reis e Antonieta de Barros são dois grandes exemplos disso, mas não estão sozinhas. Somam-se a elas as inúmeras mulheres negras, professoras anônimas, que todos os dias fazem da sala de aula um território de resistência e esperança. É através delas que continuamos a viver, relembrar, narrar e transformar.
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